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25 de Abril de 2024

Não faz sentido em falar em pizza do mensalão, diz constitucionalista da USP

Publicado por Folha Online
há 11 anos

RICARDO MENDONÇA

DE SÃO PAULO

O constitucionalista Virgílio Afonso da Silva, professor titular da Faculdade de Direito da USP (Universidade de São Paulo), não se convence com os lamentos pela aceitação dos recursos de parte dos condenados no processo do mensalão.

A razão é elementar. Para ele, não faz sentido falar em pizza ou falha do STF (Supremo Tribunal Federal) já que o processo ainda não acabou.

"As pessoas estão com essa ideia imprecisa, totalmente imprecisa, de que os réus foram absolvidos", diz. Na sua avaliação, o que deve ocorrer é o contrário: "A tendência é de se confirmar quase tudo o que já foi decidido no julgamento original". E o mais importante, insiste, é o resultado final.

Livre-docente em direito constitucional com doutorado pela Universidade de Kiel, Alemanha, Virgílio não tem receio de ir na contramão do senso comum ao analisar esse caso. Para ele, o mensalão não deve entrar para a história como um dos julgamentos mais relevantes do Supremo, corte cuja competência penal é apenas "marginal", diz.

O pesquisador diz reconhecer a importância política do caso, mas garante que, para o direito constitucional, trata-se de um julgamento "irrelevante". Sua comparação é com a sentença do ex-presidente Fernando Collor elaborada pelo mesmo STF, processo que também tinha natureza penal: "Ninguém mais lê, não virou referência".

Outra opinião destoante é em relação às transmissões dos julgamentos pela TV, celebradas por muitos como um março de transparência. Para ele, esse tipo de publicidade faz mal à corte. Virgílio defende que os debates do STF deveriam ser feitos de forma reservada, sem sequer a publicação dos votos perdedores. As transmissões, diz, impedem o ministro de reconhecer erros e voltar atrás mesmo quando são confrontados com argumentos melhores.

Já em relação ao sistema de indicação dos 11 ministros da corte, com escolha por parte da Presidência e sabatina no Senado, o constitucionalista faz poucos reparos. As garantias de independência dos magistrados após as nomeações são mais importantes que o sistema de escolha, afirma. E isso, na sua avaliação, tem funcionado bem no Brasil, melhor até do que nos Estados Unidos.

*

Folha - Alguns disseram que a imagem do Supremo saiu arranhada após a aceitação dos embargos infringentes no mensalão. Teve gente que falou em pizza, cultura da impunidade, enfraquecimento da democracia. O senhor concorda?

Virgílio Afonso da Silva - Não. Talvez nessas primeiras horas as pessoas fiquem pensando que vai terminar tudo em pizza como sempre. Mas isso vai depender do resultado final. Não importa se vai ter recurso ou se não vai. O que importa é o final.

E para o julgamento final há uma certa tendência de se confirmar quase tudo o que já foi decidido no julgamento original. Pode ter aqui ou ali alguma diminuição de pena e, claro, em alguns casos isso pode mudar do regime fechado para o semiaberto.

Mas não deverá mudar muita coisa. Inclusive, acho ministros que votaram pelo cabimento dos embargos infringentes vão manter o que haviam decidido antes. Celso de Mello, por exemplo. Não acho que seria possível falar agora em impunidade, pizza ou arranhão na imagem do Supremo.

Não parece estranho que, 25 anos após a Constituição, a corte mais importante do país ainda fique tão dividida para decidir algo tão trivial no direito, o cabimento ou não de um recurso?

Mas isso não é uma peculiaridade só desse caso. Ocorre no mundo inteiro. Seja por razão ideológica, moral ou jurídica substancial, há placares muito apertados mesmo em constituições com mais de 100 anos. No caso desses embargos, é importante lembrar que isso é uma ação penal. É um caso marginal do STF. O Supremo não está lá para isso.

Claro, é uma das competências do Supremo, em alguns casos ele é a primeira e última instância. Mas na atividade de um tribunal como o STF, julgar esse tipo de ação é marginal. Então os ministros nunca se debruçaram sobre isso, discutir se numa ação penal originária, como essa, se houvesse quatro ministros que votassem diferente, se caberia embargo infringente como dizia ou diz o regimento.

Essa é uma pergunta que nunca foi colocada. E é uma pergunta que só poderia ocorrer daqui a 50 anos se não ocorresse o mensalão agora.

Levando em consideração o pa...

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Discordo do argumento de que é improvável haver alterações nos julgamentos. Na verdade, a tendência é que a maioria dos réus seja absolvida pelo crime de formação de quadrilha, já que os dois novos ministros (Barroso e Zavascki) não votaram no primeiro julgamento, que em geral terminou 6 x 4 (na época o STF tinha apenas 10 integrantes). Veja aqui como votou cada ministro: http://www1.folha.uol.com.br/especial/2012/ojulgamentodomensalao/placardojulgamento/a_participacao_do_ex_ministro_jose_dirceu.shtml a).

Então dos 6 votos pela condenação, um já se aposentou (Ayres Brito), enquanto os 4 pró absolvição ainda estão lá e provavelmente não modificarão seus votos. Como Barroso já fez defesa apaixonada do caráter de José Genoino em plenário, deixando antever sua posição sobre o crime de formação de quadrilha para o núcleo político, a decisão deve ficar nas mãos de um calado Teori Zavascki, igualmente recém nomeado pela presidente Dilma, e que, na prática terá que "invalidar" o voto de Ayres Brito pela condenação.

Coloque-se ainda em perspectiva a provável aposentadoria do Ministro Celso de Mello (http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,amigos-de-celso-de-mello-preveem-aposentadoria,1075155,0.htm), e até mesmo do Ministro Joaquim Barbosa (cujos rumores em decorrência de seu estado de saúde ganham força a cada dia), e tem-se o cenário perfeito para a absolvição dos principais acusados do núcleo político pelo crime de formação de quadrilha.

É claro que a provável absolvição para este delito não altera, a meu ver, a relevância do julgamento, que é histórico tanto pela mudança de paradigma (antes o STF não condenava ninguém, tendo absolvido até mesmo o ex-presidente Collor, decisão esta que realmente merce esquecimento) quanto pelos votos substanciosos e incisivos da maioria dos Ministros, alguns de uma prosa magistral, beirando a poesia.

Outro absurdo que aparece na matéria é a sugestão de que as sessões do STF deveriam ser secretas, sem ao menos efetuar-se a publicação dos votos perdedores.
Acho que a imagem do STF com certeza sai arranhada perante a opinião pública com o adiamento da execução, mas ainda assim fica melhor do que antes das condenações. Talvez fique pior, muito pior do que antes, caso se confirmem as absolvições (e em conseqüência o regime de cumprimento de pena) dos principais acusados políticos, o que acredito bastante provável, mas que ainda é algo a se conferir. continuar lendo

Concordo plenamente. continuar lendo

Questões processuais são muito complexas, inclusive para operadores de Direito, algumas vezes, como é ocaso em tela que deixou dividido o STF, com diferença de apenas um voto. Uma coisa é admitir cabimento de determinado recurso, outra coisa é prover o recurso para modificar a decisão anterior. Nem todos os recursos admitidos são providos. Os ministros do STF não poderiam se preocupar em delinear somente o caso em julgamento, mas também tiveram de considerar que aquilo que se decidisse na ação do Mensalão valerá para todos os casos em situação semelhante, ou seja, sempre que houver ao menos quatro votos vencidos em julgamento pelo Plenário do STF, caberá embargos infringentes, com base em previsão no Regimento Interno (que naquela época tinha força de lei) daquela corte, previsão essa que, segundo entendeu a maioria julgadora, não foi revogada pela atual Constituição Federal, nem pela legislação atualmente em vigor. Dessa forma, até que se mude a lei, todos os casos em igual situação serão contemplados com embargos infringentes. Recentemente foi proposta a revogação desse recurso, mas o Poder Legislativo acabou não aprovando o projeto de lei nesse sentido, permanecendo assim, até hoje, inalterada essa questão. Resta saber agora se, com sua nova composição o STF irá manter ou modificar a decisão proferida no processo do Mensalão. continuar lendo